A Presença do Rosto do Passado





Rostos desconhecidos. Muitas, muitas pessoas a respirarem o ar que devia ser dela. Uma panóplia de objectos que era impossível identificar naquele edifício escuro e enorme, atolado de sons, cheiros e matéria.

Caminhava medindo cada passo, não fosse embater em alguém mais e perder o seu tempo com desculpas inauditas e outra série de gritos agudos e agonizantes.Ia em direcção à porta que via alguns segundos antes que a multidão a voltasse a engolir, o seu único desejo é que estivesse no caminho certo, queria tanto sair dali, respirar um pouco de ar fresco, sentir o chão debaixo dos pés e finalmente conseguir identificar onde acabava e começava o seu próprio corpo.
Parecia que caminha na eternidade de um deserto, apesar de as suas pernas estarem ainda bem firmes na passada, indicando que nem 100 metros havia andado, na sua mente via no horizonte uma porta imaginária cada vez mais e mais distante.

Finalmente sentiu a madeira enrugada na mão e empurrou. Saiu desenfreada e inspirou sôfrega, mas discretamente. 
Na rapidez dos seus movimentos pensou avistar um rosto, mas continuou o seu caminho. Porém, os seus ouvidos ainda meio doridos podiam captar:
- É ela, não é? É mesmo ela – Gargalhadas - Como era o nome dela?

Nunca ouviu a resposta do outro homem, mas nem precisava, ela sentia o seu rosto mesmo de costas e a sub consequente vontade de fugir e ao mesmo tempo olhá-lo só mais uma vez, a dualidade das suas vontades estava a sufocá-la mais que aquela multidão poderia.

- Era Madalena?

Nunca soube o que ganhou, se a irritação ou a vontade de o ver, mas, num impulso, deu meia volta e disse:
- É Helena.

Continuou a sua caminhada insatisfeita com o vislumbre de segundos que tinha tido daqueles olhos que sempre a hipnotizaram, ainda assim sentia as pernas bambas e o coração a querer voar, saindo do seu corpo. Tudo o seu nervosismo só piorou quando sentiu que havia umas passadas a segui-la. Quanto mais rápido ela caminhava, mas rápido as passadas lhe soavam. Olhava em volta num doce desespero tentando decidir onde ir, havia relvados separados por canteiros uns ao sol e outros na sombra, uma ponte de madeira, caminhos de alcatrão.

Inconscientemente deu por si a escolher o lugar onde seria melhor vê-lo e a forma como se ia virar e o que lhe diria ao invés de planear a sua fuga.



Continua...

Comentários

Peregrino disse…
cadê a continuação???

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